Como é para você estar no set de "A Onda"?
Ron Jones - É uma sensação impressionante estar nesse ambiente hoje, e observar esse grupo de estudantes é como se estivesse vendo fantasmas. Eu estou vendo os estudantes verdadeiros, então estou de volta a 1967: ali está o Doug circulando e lá está o Steve, o comediante da turma. Temos duas meninas que sentam na frente, Aline Lavin e Wendy, inteligentes e maravilhosas, e temos também o Norman, sentando na fileira de trás com seu sorriso com dente de ouro, além do Jerry. Eu estou tendo uma estranha lembrança dessa turma similar.
Como foi sua reação às primeiras filmagens?
R.J. - Bem, a primeira coisa que observei ao ver aquela correria foi que era como estar na sala de aula ao invés de observar a distancia - era como se eu fizesse parte daquilo. E também o fato de ver todas aquelas pessoas que me pareciam familiares e compreende-las bem. Mas o filme retratava algo a mais que eu não compreendia, que eu nunca havia escrito nada a respeito, como a dinâmica entre os jovens professores e os professores mais velhos. Existem maneiras de ser um professor e maneiras ainda mais novas, e isso existia na escola em que eu lecionava e provavelmente isso existe em cada escola – isso se chama A Onda em nosso filme.
Uma outra característica do filme que eu nunca escrevi a respeito é a dinâmica entre um homem e uma mulher que são casados há muito tempo. Minha esposa e eu estamos justos há 43 anos, e todos os sinais sutis com que nos comunicamos - todos aqueles pequenos mecanismos do tipo “pare com isso”, ou “você está indo longe demais” – são mostrados em A Onda. Minha esposa basicamente disse “você está indo longe demais, é perigoso para você e para as pessoas ao seu redor”, e isso foi registrado nessa versão de A Onda. Portanto, o filme é de uma beleza única, ele fala ao coração, não é uma história cerebral, é a glória dessas crianças maravilhosas, que são como flores em nossos caminhos, e o que acontece quando elas aparecem em nossas vidas. É também o que acontece quando um professor vai um pouco além da conta e se torna um ditador.
Olhando para trás, o que você acha que aconteceu? Você achou a experiência válida?
R.J. - Bem, eu nunca faria de novo. Colocar crianças em perigo é algo que não se deve fazer. Válida? Eu me deparei com um pouco da natureza de nossa psique, e isso é muito útil. Portanto considero o efeito válido, e acho que um filme deve ser feito, se isso fizer com que as pessoas estudem e falem a respeito também. A cultura germânica é única, sabe? São os únicos que eu conheço que estão realmente preocupados com a violência, a estudam, porque não querem repeti-la. Considerando que na minha cultura já aconteceram coisas graves, como Hiroshima e Nagasaki, nós não estamos estudando isso. Os alemães são os únicos, não conheço ninguém mais preocupado. Estão olhando para A Onda e tentando entender por que desistimos de nossa liberdade em troca de um sentimento de superioridade. Isso é uma lição que todos nós temos que aprender e falar a respeito.
Quais foram seus sentimentos e emoções durante a experiência?
R.J. - A experiência aconteceu unilateralmente. Eu descobri como ensinar realmente bem, porque as pessoas estavam aprendendo rapidamente. Eu costumava chegar em casa dizendo a minha esposa, Diana, que eles estavam realmente aprendendo. O que é curioso, já que a turma era bem dispersa quando tinha mais liberdade, e agora que a rigidez era maior, eles respondiam a todas as perguntas e pareciam ajudar muito mais uns aos outros. Então eu me deparei com esse ótimo modo de ensino. Mas é claro que as consequências foram danosas para todos. Então minhas emoções eram como uma montanha russa.
Como sua esposa reagiu à experiência?
R.J. - Minha esposa lecionava em outra escola durante esse tempo, no nível primário. E éramos jovens professores, os dois cheios de idéias e energia. Ela estava a par do que estava acontecendo e foi a pessoa que felizmente – talvez sejam as mulheres que irão salvar nosso destino na vida – me disse que aquilo não era certo. Disse que não era bom para mim, por que eu não saberia onde isso iria dar e porque eu estava ferindo outras pessoas, além de não ser algo que eu acreditava, não era democracia. Era perigoso. Então ela foi quem me colocou de volta em algum tipo de realidade e me forçou a parar com A Onda. Por isso eu acho que todo mundo deve ter uma boa esposa ou mulher por perto que possa dizer: “Ei, pare com isso.”
Quando foi que você percebeu que tinha ido longe demais?
R.J. - O momento exato em que soube que tinha ido longe demais foi quando Robert me seguiu até a sala da coordenação. Eu não previ aquilo, e lá estava ele na coordenação, até que outro professor, Bonnie, o coordenador do departamento de inglês, muito parecido com o personagem do filme, deixou seus óculos cair até o nariz, olhou para Robert e disse: “Robert, você não deve estar aqui, essa é a sala da coordenação, apenas para os professores.” E Robert olhou para Bonnie e disse “Eu não sou um estudante, sou um guarda-costas”. E foi aí que eu soube que ele tinha atravessado alguma linha invisível, e aquilo que era apenas uma simulação se tornou algo real. E percebi que eu também estava atravessando essa mesma linha. Eu não estava mais apenas ensinando alguma coisa sobre essa coisa chamada fascismo, eu estava gostando de ser um líder, o que era assustador.
A Terceira Onda funcionou devido ao fato de você ser um professor popular?
R.J. - Não, não. A experiência funcionou porque muitos de nós estávamos perdidos, sem família, sem pertencer a uma comunidade, sem a sensação de pertencimento, e aí aconteceu de termos um professor dizendo “posso dar isso a vocês”.
Então a experiência poderia funcionar hoje em dia?
R.J. - Ah, já está funcionando hoje em dia, em cada escola. As pessoas sempre perguntam se poderia acontecer hoje. Ora, é só olhar na escola mais próxima. Onde está a democracia? Sempre falamos de democracia, mas não estamos experimentando-a. Você não está decidindo que livro ler ou que temas discutir ou como ajudar um ao outro a se tornar um cidadão melhor. Você segue o seu currículo porque alguém diz que é o currículo certo, ou está fazendo uma prova para ir para algum lugar melhor – é tudo controle. Mas você não tem o controle, esse controle é de outra pessoa.
Quais foram as consequências para você?
R.J. - Não por causa da Onda, mas por minha luta por direitos civis e contra a guerra no Vietnã, eu fui despedido dessa escola três anos após a experiência de A Onda, e eu nunca mais pude lecionar em escolas públicas. Portanto minha vida sofreu uma mudança que eu não previra. Eu queria ser um bom professor de história, um treinador de basquete e criar minha família. Isso seria maravilhoso, mas não me foi permitido. Como conseqüência, fui forçado a procurar diferentes lugares para lecionar, por isso eu dei aula para deficientes mentais durante 30 anos.
O que você pensa dos cineastas Dennis Gansel, Peter Thorwarth and Christian Becker?
R.J. - São realmente fascinantes! Dennis e eu nos comunicamos por carta e foi encantador. Ele foi honrado e me respeitou mandando o seu roteiro, não teve medo. Além dessa troca de cartas sobre o que ocorre nas salas de aula, o que nós observamos como confiar um no outro, foi como encontrar um irmão mas velho, no caso do Dennis, porque ele volta e meia tem escrito. E com o Peter é a mesma coisa. Quero dizer, nós, escritores, sabemos como reagimos a esse mundo pirado que tentamos compreender. Às vezes nós conseguimos pouco, às vezes conseguimos mais, mas estamos sempre tentando descobrir o que é: o que é o coração, o que é a vida, como fazer melhor. Nós estamos na mesma busca. Portanto é como ser irmãos por um momento. Já o Christian é um produtor, um outro tipo de pessoa. Produtores são parte dessa força que nos reúne por um momento, eles são muito acessíveis. Ele é fascinante, justamente por ter essa energia e a capacidade de ficar dois anos conversando com a Sony. Quem mais gastaria dois anos em busca de um sonho? Ele é um caçador de sonhos, e nós precisamos disso, como precisamos de pessoas como Peter e Dennis para tornar esse sonho realidade.
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