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sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Análises da historiadora Graça Salgado* sobre “A Onda”

O filme é uma importante metáfora sobre o perigo da emergência dos irracionalismos no mundo contemporâneo: fundamentalismos de todas as espécies e formas e a incapacidade de convivência com a diferença (racismos, homofobia, jovens de classe média que matam índios por puro divertimento, entre outros). O filme desmascara muito corretamente o poder de movimentos doutrinários, sejam eles políticos ou religiosos e se aplica a várias experiências totalitárias.

A experiência pedagógica, que fugiu do controle do professor, também é muito instigante pois ela alerta para a possibilidade de que o surgimento de ditaduras são sempre possíveis em qualquer sociedade e para isso é só olhar experiências recentes na França(Le Pen), organizações islamo-fascistas, Áustria, os skinheads atuando em vários países, inclusive em São Paulo, e nos EUA parece que existem mais de 400 organizações de extrema direita atuando em diversos setores, inclusive em órgãos governamentais.

Portanto nenhuma sociedade está livre de uma experiência desse tipo. A saída: reforçar a cultura democrática, valorizar a política como um espaço republicano de construção da liberdade, sobretudo nesse momento de crise mundial das democracias representativas. Todos reclamam que os políticos são péssimos, corruptos e que a política não é mais importante. Ledo engano. Os maus políticos estão lá porque alguém votou neles, portanto incentivar uma cultura democrática é a única saída para que a sociedade saia desse torpor e do individualismo que não leva a nenhum lugar. Só através da política se constrói e se fortalece as instituições democráticas. Não há outro meio.

E com todos os defeitos que a DEMOCRACIA possa ter não conheço ainda nada melhor que a possa substituir.

"O que faz um povo renegar a sua própria história?". Essa questão é absolutamente fundamental para um professor de História em sua experiência de sal de aula. Se não contribuirmos para a construção de memórias, certamente a sociedade construirá o esquecimento. É mais fácil esquecer. E aí é onde mora o perigo das repetições de episódios como as ditaduras militares dos anos 60 e 70 na América Latina, o nazi-fascismo e outros episódios de tristíssima lembrança.

Eu vivi a minha juventude inteira sob uma feroz e cruel ditadura militar e tenho essa experiência como a mais traumática da minha vida.

Cabe ao professor reforçar a ética da tolerância, o respeito à diversidade e mostrar que a democracia, com todos os seus problemas, ainda é a melhor opção para a vida dos seres humanos. Além disto, ele mesmo buscar a prática do respeito e do espírito democrático e pluralista em relação aos seus alunos.

O que o filme passa muito bem é a idéia da ausência de "uma causa", que é uma experiência muito comum entre os jovens contemporâneos. Eles mesmos falam claramente sobre isto: "Contra o quê a gente vai se revoltar?" E em outro momento, se referindo ao movimento: " Ele deu significado à minha vida".

Nesse sentido, é uma geração oposta à geração dos anos 60. Mesmo aqueles que não tinham aparentemente causa, lutavam pela bandeira do "é proibido proibir"; contra o sistema e o mainstream. No Brasil, a luta armada foi um bom exemplo de jovens lutando e perdendo a vida por uma causa, que era a derrubada da ditadura militar. Foi a década das utopias possíveis e nesse sentido vejo um imenso desencanto e até mesmo tédio( excelente a passagem em que os alunos da turma de "anarquismo" reclamam sobre o tédio que sentiam na aula. Não é uma coisa prá pensar? Numa aula sobre anarquismo? Muito interessante!!!).

Outro aspecto que gostaria de ressaltar está mais situado no campo da psicologia do que da História. O movimento permitiu (no caso real que ocorreu nos EUA em 1967, pelo menos) que emergissem figuras que em um grupo ou sala de aula não têm maior expressão (aliás, o mesmo ocorreu com Hitler que era uma figura absolutamente medíocre em tudo antes de se tornar o monstro que foi) pois não são nem inteligentes, nem bonitos, nem bons em esportes, não impressionam as garotas, não possuem traços de liderança. Enfim, são pessoas em busca de um lugar de "pertencimento" e de identidade.

A imprensa sempre chama a atenção que esse é exatamente o perfil daqueles "pequenos assassinos" que, nos EUA, saem disparando nas escolas contra colegas e professores, como ocorreu em Columbine e em outros lugares.

Esse aspecto ressalta mais uma vez a falta de uma causa para a existência dessas pessoas. Estão à procura de um lugar, de uma causa, de algum reconhecimento e de um sentido de pertencimento.

*Graça Salgado participaria da mesa de debate da pré-estréia na UniRio mas não pode comparecer devido à motivos de saúde.

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